22.11.12
Um rio e algumas pedras.
Já não podemos silenciar.
Calar é dor abismal.
O silêncio provoca ilhas de angústia, flutuamos em um mar de almas.
A mediocridade humana assumiu o silêncio como perigoso. Combate-se o silênciio com armas poderosas: carros, bebês chorosos, mães escandalosas, pais brutais, aviões, igrejas e filmes de Hollywood.
E é nessa barulheira imensurável que o procuro. Procuro o silêncio que me arrebata...
silêncio onde falo o que devo, silencio que me faz calar, que diz, que fala de minha longínqua morte como algo presente no meu café preto pela manhã.
Em silêncio nos cobramos aquilo que ainda nem tentamos, por uma preguiça mundana de termos o controle. Silêncio que passa sempre apressado por nossos olhos cansados, e quando uma lágrima o denuncia... calamos - alguns pequenos instantes de puro prazer e angústia - os sons se assumem tão altos que já não podemos ouvir. Tudo invade! Sentimos então uma pena mortal de uma semente de flor abandonada ao asfalto seco ou de um bom velhinho que ainda insiste em carregar o peso-cruz da sobrevivência.
Em barulhos tentamos o silêncio. Mas silêncio de insistência não é silêncio. Silêncio é invasão. É dor de morte. Silêncio é uma revolta de sua alma para não mais ter que responder. É um minuto de cigarro.
Hoje, corri para meu silêncio. Encontrei uma dificuldade bestial em o encontrar. Mas achando, não o entendi. Não mais conversava comigo, ou melhor não mais pedia com extrema delicadeza que palavras saissem de minha boca. Deve ser minha alma cansada em conviver com um amor impuro. Já não falo com meu silêncio, já não sinto o calor de seu carinho, o conforto de seu inconformismo.
Então, entrego-me a dor de minhas palavras, em silêncio. E calando, tento voltar a ouvir. Pois acredito que ouvindo, perceberia o caminho perfeito para amar.
E amando de peito estufado, meu silêncio voltaria a tagarelar e a sorrir.
Silêncio,
meu amigo,
estou chegando.
13.11.12
Portas
Chuva, um bom sinal para ficar.
Em um mundo de cobertas
te caço,
um animal ávido e faminto
de alma.
Dou o bote e espero
seu silêncio.
A chuva aperta,
aperto
seu corpo.
Paro.
Sair é covarde.
Prefiro a inércia de uma paixão
que cria seu próprio mundo,
onde nós flores crescemos sem porquê.
Lá fora tudo alaga
e correntes carregam pessoas
robotizadas
já não podem molhar.
Guarda-chuvas, medo, carros.
A dor do sim
guilhotina
a alegria do não,
enquanto robôs trafegam em contramão
sem noção,
sem criação.
Por isso, mais e mais
cobertas e você.
Descobertas em você.
E que a chuva caia
e me ensine a não sair...
de dentro de ti.
20.3.12
depois de você
Abri a janela para um cigarro e o amor se foi.
Foi porque tinha que ir,
meu corpo juntamente com minha alma já não dançava.
Flores são estúpidas convenções para um sentimento
que se esforça para sentir
enquanto o vinho abandonado teima sobre a mesa,
como se algo extraordinário ainda pudesse ser servido e degustado.
Nada, apenas vinagre. A dor do vinagre .
O sexo, outrora imaculado por olhares lacrimejantes,
tornou-se um tesão em partes isoladas e posições.
O gozo,
um mero preenchimento de papelada em uma repartição pública: necessário e sem porquê.
A chuva chove.
Um certo desespero me faz molhar sob suas gotas que caem doloridas.
O transtorno do vazio não me deixa lavar, apenas encharca.
Sou poça, lama e alguns sapos.
Espelho, sim um espelho.
Preciso de algo concreto para refletir minha estúpida personalidade,
um último suspiro para enxergar o príncipe adormecido em mim.
Olho, procuro e não vejo.
Mas aos poucos,
minha carcaça taciturna e molhada assume uma forma jovial e brilhante.
Uma criança emerge entre cores com cheiro.
Ela se põe a dançar uma música inédita a meus ouvidos
e eu choro aquele choro engasgado e agudo.
Percebo-me então ainda capaz de lágrimas,
e nesta sofreguidão encontro algum sentido para a felicidade.
Da poça há de nascer uma flor.
Do vinagre há de nascer um vinho.
E da dor, um amor.
Por favor, mais um cigarro!
Eu amo te amar.
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